terça-feira, 16 de setembro de 2008

Primeiro dia de escola

Com sete anos de idade, chegou a altura de ir para a 1ª classe, lembro-me perfeitamente do meu primeiro dia de escola, era franzino, baixo e tímido, fui com duas das minhas irmãs mais velhas, que também frequentavam a mesma escola. Recordo-me de me terem deixado no recinto dos rapazes e de as ver afastarem-se para o recinto das meninas, estávamos separados por um muro, fiquei ali no meio de todos os outros rapazes. Praticamente nunca saíra da quinta, estranhava ver tantos rostos desconhecidos e todo aquele movimento.


foto tirada daqui


Pouco depois, eu e os outros rapazes fomos encaminhados para o átrio, no interior da escola, onde fizeram a chamada, levando-nos pouco depois para a sala de aulas. Lembro-me perfeitamente de ver as carteiras em madeira todas em fila, com o tampo ligeiramente inclinado e banco corrido, para dois alunos, com dois tinteiros (um em cada ponta). Ao fundo tinha a secretária da professora e na parede, ao centro um crucifixo, e de cada lado, duas fotos, uma de Salazar e outra de Américo Tomás, os dois chefes do Governo. Também se encontravam mapas, do corpo humano, dos rios, serras e as linhas dos caminhos-de-ferro, de Portugal e ultramar. No canto do lado direito estava uma lareira, pois os Invernos da Serra eram muito rigorosos.

A escola, modelo Estado Novo, estava dividida ao meio, metade dos rapazes e outra metade das raparigas, mesmo o recinto do recreio estava dividido por um muro, que ninguém ousava ultrapassar. Nas traseiras, havia um alpendre (de cada lado), com telheiro, onde se encontravam as retretes e que serviam também para abrigo da chuva.

“Bom dia Senhora professora”, era assim que tínhamos que dizer, todos em pé, quando entrasse a “nossa senhora” Dona Arminda.

Foram momentos inesquecíveis, que estaria aqui a contar ainda por mais umas páginas.


Segundavida

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Quinta da Regaleira em Sintra

Já visitei a Quinta da Regaleira umas quatro ou cinco vezes, mas não me canso de lá ir, pois aquele lugar fascina-me, não só pelo magnífico jardim, repleto de árvores e plantas luxuriantes das variadíssimas espécies, como também pelos edifícios trabalhados em pedra por refinados artífices e todo o mistério envolvente.


“A Quinta da Regaleira é uma mansão filosofal criada entre 1900 e 1912 pelo seu primeiro proprietário, António Augusto Carvalho Monteiro e pelo arquitecto e cenógrafo Luigi Manini, o mesmo do Palace Hotel do Buçaco. O palácio e a capela neomanuelinos apresentam – ao contrário do Buçaco, também neomanuelino, uma simbólica esotérica relativa à tradição mítica portuguesa e a algumas correntes iniciáticas.” Do livro, Portugal Misterioso.


Palácio da Regaleira, foto tirada através da vegetação envolvente.


No último fim-de-semana do mês de Agosto recebi a visita de familiares, que de tanto ouvirem (bem) falar da Quinta da Regaleira, estavam também desejosos de a visitar, por isso servi-lhes de umas espécie de improvisado guia.

Iniciámos a visita, em ascensão, através do Patamar dos Deuses, um corredor ladeado por 12 estátuas de divindades da mitologia Greco-Romana. Em seguida caminhámos junto do lago da Gruta do Labirinto, onde entrámos e tivemos que fazer uso de uma lanterna, que (surpreendentemente) propositadamente já trazia de casa e nos valeu para percorrer os túneis obscuros do labirinto, que ainda hoje não sei onde acabam.

Já no exterior, percorremos caminhos e jardins até ao Lago dos Cisnes, onde, em pedra sobre pedra, entrámos novamente em túneis escuros, que nos levavam a outros mais tenebrosos e por sua vez ao fundo de um poço, nas profundezas da terra, onde se encontrava gravada uma cruz templária o símbolo heráldico de Carvalho Monteiro e símbolo da harmonia e também da Cavalaria Espiritual na Maçonaria Escocesa.

Poço iniciático, foto tirada desde a base.


Poço iniciático, foto tirada de cima, vendo no fundo a Cruz dos Templários


A volta tinha sido feita ao contrário, em vez de se descer o poço iniciático até às profundezas da terra, subimos as escadarias em espiral, até ao céu. Aí saímos por uma espécie de porta secreta, divinamente e estrategicamente camuflada por um aglomerado de penedos.


Do céu voltámos novamente à terra, desta vez em sentido descendente, passando pela Torre da Regaleira, Gruta da Leda, até à Capela da Santíssima Trindade, toda ela talhada em estilo gótico-manuelino, com torres verticais a chegar a Deus e belíssimos vitrais no seu interior.


Pormenor da fachada principal da Capela da Santíssima Trindade


Por fim, terminámos a visita no Palácio, que é o edifício principal, todo ele de uma beleza fascinante, em cruzamento de vários estilos arquitectónicos, como o Manuelino, Renascentista, Romântico e Gótico.

No interior há a salientar os magníficos tectos em talha de madeira de carvalho e castanho, as belas pinturas na parede, a emblemática Sala da Caça, a Sala dos Reis, onde se encontram representados em pinturas, a grande maioria dos reis de Portugal e a surpreendente biblioteca, onde o chão é rodeado de espelho, dando a ideia arrepiante de um pavimento suspenso.

No final constatámos que tínhamos demorado 4 horas e que a visita em alguns locais tinha sido ligeira, por isso muita coisa tinha ficado ainda por apreciar. Descrever todos os passos da visita a este belo local encheria várias páginas deste meu espaço, pelo que só visto e...sentido.


Vale a pena consultar:


http://www.esquilo.com/jardins_regaleira.html
http://www.cm-sintra.pt/Artigo.aspx?ID=2907

http://atracoessintra.no.sapo.pt/partesquinta.htm#quinta




Segundavida


quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Contra-natura

Numa entrevista a um tal indivíduo que se auto-intitula Conde White Castel, para uma revista do panorama nacional, numa fase da conversa sobre a relação que “ele” mantinha com o filho, a jornalista perguntou-lhe, “ Têm conversas sobre sexo?”, tendo ele respondido “…digo-lhe que pode ter as namoradas que quiser, mas para nunca as engravidar, se não deserdo-o na totalidade”. Seguidamente interrogou-o, “Não gostava de ser avô?”, ao que ele respondeu, “Odiava…tio para sempre! Adoro crianças, mas entrava em pânico se tivesse uma coisinha mínima a chamar-me avô. Fazia uma plástica, esticava-me todo.”

Da individualidade que se trata tudo se pode esperar, pois já tantos comportamentos ridículos teve e barbaridades disse, mas estas palavras deixaram-me arrepiado de tanto asco, são uma aberração, como quem as proferiu. Ser avô/avó é o testemunho da continuidade, a oportunidade de dar colo, afagar uma vida inocente e ternurenta. É o símbolo da esperança.


A natureza humana é como uma árvore que nasce, cresce, se ramifica, floresce e deita as suas sementes à terra, as quais, por sua vez, vão dar lugar a novos rebentos que continuarão o ciclo da vida. Como é possível que um pai ameace e intimide o seu filho para que não dê continuidade à vida? Só um ser egoísta, perverso e contra-natura!

Segundavida

sábado, 9 de agosto de 2008

Vendilhões de dignidade

Nestes últimos tempos estive um pouco ausente da net, principalmente da blogosfera, não sei explicar a razão, algumas vezes por falta de tempo devido ao trabalho, outras, por falta de inspiração, ou, por ter o pc ocupado pela minha herdeira, que está em férias escolares, mas aqui estou eu a escrever sobre um tema que tenha andado a matutar.


Quando era pequeno ouvia dizer a meus pais que o dinheiro era a coisa mais porca que existia à face da terra, explicando que as notas e moedas passavam de mãos para mãos de todo o tipo e classe de gente, desde o mais pobre ao mais rico, do arrumador de automóveis ao engenheiro ou do doente ao são.

Eles simplesmente se referiam à matéria de sujidade que o dinheiro vai adquirindo e suportando ao longo dos tempos, mas nos dias de hoje eu poderia responder-lhes que o dinheiro também transporta consigo e cada vez mais, outro tipo de sujidade, uma espécie de imundice indecorosa e por vezes desonesta, que conspurca a alma de muita gente.

Vários acontecimentos na nossa sociedade levam-me a reflectir que o muito dinheiro, fama e poder “transformam o visual” de certas pessoas. Com a riqueza, por magia, os velhos passam a novos e os feios ficam lindos de morrer. Quantas vezes têm assistido na nossa sociedade, a enlaces de velhos e feios com novas e lindas mulheres e vice-versa!? Claro que toda a gente tem direito à felicidade, mas nestes casos é só hipocrisia e (im)puro jogo de interesses. Poderia focar alguns casos mas não vale a pena, pois são do conhecimento de muita gente.

Na maioria dos casos de corrupção, tráfico de droga e burlas, o dinheiro é o móbil e leva muita gente a vender a sua alma.


Também no mundo do futebol, o dinheiro faz perder a lucidez. Ultimamente, no nosso panorama futebolístico, surgiram dois ou três casos, destacando um jogador de uma das três equipas “grandes”, tido como um exemplo de futebolista, com grande carácter, uma humildade e dedicação ao clube de assinalar, que vendo a oportunidade de ganhar milhões, ficou ofuscado, esquecendo os compromissos assumidos.

Pelos vistos, não há nada que o dinheiro não compre, até a dignidade!

Segundavida

terça-feira, 17 de junho de 2008

Voltámos aos três efes

Fátima, Fado e Futebol, ouvia dizer que nos tempos do antigo regime, marcados pela miséria e opressão da ditadura do Dr. Oliveira, eram estes três eventos, com as iniciais em efe, que abafavam as mágoas da grande maioria dos Portugueses.

Nos tempos que atravessamos, também a maioria está a atravessar uma difícil crise, desta vez causada na minha opinião por factores externos, entre eles a guerra do petróleo, cada vez mais escasso e de que somos totalmente dependentes.

O nosso governo, cativo das rigorosas exigências da UE, viu-se obrigado a apertar-nos o cinto, protelando a subida de escalões dos funcionários públicos, bem presos pela rédea e aumentado os impostos, que por sua vez atingem todos os sectores económicos do país. E quem paga a maior fatia da crise são as classes mais desfavorecidas, pois as perdas para “os outros” são apenas migalhas.

Crise, mágoas, preocupações e lá voltamos aos três efes. Em Fátima eram milhares e milhares, nunca se viram tantos peregrinos, este ano bateram-se os recordes de afluência ao santuário. Outros, em suas casas acompanharam religiosamente as cerimónias transmitidas pelos meios de comunicação social. É grande a fé em Nossa Senhora para que a graça divina atenue as dificuldades da vida e nos proteja das desgraças.

Ao fado, já se lhe conheceram melhores dias, ele já não é um fado que canta um “povo que lava no rio” mas seja como for, permanece enraizado na nossa cultura, pois ele procura cantar o destino e a vida das gentes do nosso povo, que continua a “talhar com o seu machado as tábuas do (...) caixão”.

Quanto ao futebol, foi, é e pelos visto será sempre um fenómeno nacional. A semana é vivida, para muitos, em função do que acontece no futebol, principalmente no que se refere ao Porto, Sporting e Benfica: fazem-se prognósticos para o fim de semana, depois discutem-se os resultados dos jogos e no início da semana faz-se o rescaldo, tudo isto com grande paixão e mediatismo dos meios de comunicação social e umas borracheiras à mistura.

Em pleno Euro 2008, a nossa selecção passou aos quartos de final da competição, é a euforia total, agora todos nós esperamos que Portugal chegue à final de Viena e vença o Euro.

É assim, qual crise? Vamos esquecer os impostos, os baixos ordenados, o aumento constante da gasolina, as dificuldades da vida, vamos rezar, ouvir cantar o fado e ver futebol, pois há que ter fé num futuro melhor.

Segundavida

segunda-feira, 2 de junho de 2008

A caminho...do fim!

A caminho


A matéria encaminha-se para o caos como um rio se dirige para o mar.
Nós, os vivos, somos como pirogas lutando contra a corrente do tempo. Tentando iludir o tempo. Mas ele conhece apenas um caminho, segue sempre pela mesma vertente, aquela que conduz à decadência.

Preservamos a nossa forma destruindo outros seres vivos. A nossa existência resulta sempre duma pilhagem. É que a vida é canibal. A vida devora a vida.

Tudo aquilo que começa tem de acabar, senão de que serviria o tempo? E ao tempo nunca ninguém contrariou. Onde é que se viu um rio subir rumo à fonte ou um pintainho voltar para o seu ovo? O fogo mais devorador acaba sempre por perder o apetite e extinguir-se. A montanha mais alta acaba por se ajoelhar transformando-se numa planície. Mas a vida, essa aí, persiste em contrariar o tempo, surge, desenvolve-se e floresce num mundo onde tudo corre rumo à maior desordem; ela foge à calma e à tranquilidade dos objectos inanimados e avança como um equilibrista que caminha sobre a corda bamba, adiando eternamente o inevitável ajuste de contas.

Fim

Mas não podemos escapar indefinidamente às estocadas do tempo. É proibido. Um dia o meu corpo abandonará a luta e restituirá ao mundo a matéria que me compõe. Esta galáxia de milhares de milhões de átomos, que outrora me formaram, morrerá como morreram as estrelas, semeando a sua matéria pelo espaço. Todos os átomos que vieram dançar em mim irão dançar noutro sítio. Um, dois, três…e lá vão eles. Migrarão para uma árvore, para o farrapo de uma nuvem, para o pelo de uma pulga… E eu deixarei cá a minha canção para que outros a cantem à sua maneira.

(extraído do filme Génesis)

Neste filme o "Mestre" demonstrou que, nesta vida, todos temos um papel a desempenhar mas que também face às leis da natureza somos tão insignificantes, que por vezes basta um sopro, para que desapareçamos da face da terra.
Tudo tem um principio e um fim.

Segundavida

domingo, 4 de maio de 2008

O início

"Foi o amor que me subtraiu ao nada. Além disso tive duas vidas, a primeira, vivida no ventre da minha mãe; a segunda, em que habitei este vasto mundo. Do momento da minha concepção ao meu nascimento, vivi em forma condensada à história da génese.

No início fui uma criatura aquática. A bolsa das águas substituiu o mar primordial do começo do mundo. Naquela altura era eu do tamanho de um feijão, era muitíssimo parecido com os animais. Naquela idade em que o nosso corpo se forma e consolida lentamente, somos todos parecidos como se fossemos gémeos, pois somos como fios de água que jorram da mesma fonte, como as nervuras de uma mesma folha, os ramos de uma mesma árvore. Somos membros da mesma tribo, a grande tribo dos seres vivos.

Foi assim que fui um bocadinho peixe, um bocadinho rã quando ainda vivia na barriga da minha mãe. Tinha guelras no pescoço e barbatanas nos flancos e flutuava entre duas águas no meu aquário flexível e redondo.

Todos os seres se constroem, célula após célula, como uma grande vila com ruas e bairros, ao som ritmado do bater do coração. E as veias traçam-nos no corpo percursos semelhantes aos dos rios na terra."

Texto que extraí de “Génesis”, um filme que achei fantástico, em que um ancião Africano, mestre da sabedoria, conta a “sua” versão da criação do mundo e da origem da vida, fazendo também uma apologia entre o ser humano e os restantes animais, acompanhado por imagens fantásticas.

Ver sinopse do filme Génesis


A todas as mães um feliz dia!

Segundavida

sábado, 19 de abril de 2008

Mudanças no divórcio

Recentemente foi aprovada na Assembleia da República uma nova lei que acaba com o divórcio litigioso.

Anteriormente o divórcio poderia realizar-se de comum acordo, ou quando assim não fosse, entrava-se num longo processo litigioso. Com as novas regras o conceito de culpa como fundamento do divórcio acaba e ele pode realizar-se mesmo sem que seja necessário o consentimento dos dois cônjuges. Neste caso a vontade de um dos membros do casal, assente em causas objectivas, pode provocar a ruptura da vida conjugal.

Outra das mudanças é que poderá incorrer no crime de desobediência aquele que não assumir as suas responsabilidades de pai ou mãe. A meu ver, com a crise que por aí vai, que resulta num sucessivo empobrecimento das famílias, não vão faltar processos em tribunal. Recentemente quiseram descongestionar os tribunais de tantos processos, com este novo cenário as secretárias vão ficar a abarrotar, pois os incumprimentos serão aos milhares.

As partilhas passarão a fazer-se como se os cônjuges tivessem estado casados em comunhão de adquiridos, mesmo que o regime convencionado tivesse sido a comunhão geral de bens. Poderão acabam-se assim os casamentos por conveniência. Também o cônjuge que tiver uma situação mais frágil e contribuído mais para a família, no momento da partilha poderá ser compensado.

O divórcio sem o consentimento de um dos cônjuges (antigo litigioso) poderá acontecer quando existir separação de facto por um ano consecutivo; alteração das faculdades mentais do outro cônjuge há mais de um ano; ausência há mais de um ano sem dar notícia, ou quando ocorram quaisquer outros factos que, independentemente da culpa dos cônjuges, mostrem ruptura definitiva do casamento (onde se inclui a violência doméstica).

Seja com as leis antigas ou com novas regras, os processos de divórcio geram sempre grandes contrariedades e sofrimento para toda a família, principalmente quando eram resolvidos de forma litigiosa e se arrastavam por longos anos. Com a ruptura do casal e quando se envolviam filhos, eram estes que pagavam a maior factura. As crianças ficavam com traumas, pouca auto-estima e eram desde logo na infância infelizes, pois julgavam que o pai/mãe as abandonavam ou não queriam saber delas.

Sou a favor da união do casal, que se deve saber perdoar e resolver os erros no seio da família, mas quando tiver que haver ruptura, se os processos se resolverem agora de forma mais célere e se forem ambos os pais a acompanharem as situações de particular importância para os filhos, esperemos ao menos que, principalmente as crianças, tenham o seu sofrimento minorado.

Segundavida

domingo, 6 de abril de 2008

Os saloios

“À roda das grandes cidades vive uma população que, morfologicamente, pelo menos, parece distinta da urbana, a quem alimenta até certo ponto e a quem serve com assistência regular em necessidades, por via de regra, fundamentais. Em Paris são os maraicheres; em Roma, noutros tempos, os sabinos; em Lisboa os saloios” (do livro Leal da Câmara)

Desde que se me surgiu a faculdade de entender as “coisas”, ouvia chamar saloio àquele que era tosco, sem formação e até simplório. Outros chamavam de uma forma pejorativa “esperteza saloia”

Quando cheguei à região de Lisboa, migrado da Beira Baixa, comecei a ouvir que na zona noroeste de Lisboa existia a zona saloia. Principalmente habitantes dos conselhos de Mafra, Loures e Sintra, os “saloios” eram agricultores e artesãos nascidos e criados nessas regiões, os quais vinham comercializar os seus produtos para a cidade de Lisboa. Em tempos eles trajavam de um modo original, com roupas folclóricas e botas. Os homens usavam barretes na cabeça e a barba era do tipo suíças, que deixavam apenas o queixo a descoberto. As mulheres vestiam compridas saias coloridas, botas ou tamancas e mantéus na cabeça.

rancho folclórico representando a gente saloia

Interrogava-me muitas vezes donde provinha a palavra saloio, pelo que a curiosidade me levou a consultar nas bibliotecas os livros antigos da zona. Um deles, com o título “Leal da Câmara”, um estudioso das gentes saloias, deu-me as respostas que ambicionava.

As origens

“Quando D. Afonso Henriques, com ajuda dos Cruzados, tomou a cidade, estava ela repleta de mouros, repleta como um ovo. Explica-se: não teria sido outro o lugar de confluência dos fugitivos. Osberne refere que foram contados em Lisboa nada menos de 154.000 homens, afora mulheres e crianças, o que devia pelo menos duplicar este número. Tendo em vista que a urbe se limitava ao morro do Castelo, cingida em seu âmbito pelos arrais dos opugnadores, levantados no monte de S. Francisco, a Ocidente, no monte de Santa Ana, a Norte, no monte de S. Vicente de Fora, a leste, compreendidos ainda os vales circundantes, pasma-se como podia caber tanto povo num espaço tão reduzidíssimo.

Quando os cristãos, à frente as hostes de Gulherme de Longa Espada, entraram na cidade, não tardou que começasse a carnificina e o saque. Os cruzados não tinham vindo para outra coisa, e não houve compromisso nem palavra jurada que os impedisse de satisfazer a avidez e instintos ferozes. Fartaram-se de matar nos perros infiéis os bravos combatentes, mas ainda ficou muita gente. (…..) A tanta brutalidade, como podiam responder os vencidos que não fosse amontoados nas praças, vielas (….) erguendo mãos súplices e implorando Alah?!

Assim os escravos mouriscos faziam a salah, que na gíria do fero vencedor deu lugar a saloio, o homem das rezas e das mesuras, batido vendido e tocado à chibata, ridículo e ao mesmo tempo miserando. Tal é a explicação que se côa da etimologia fornecida por Pinho Leal e que se nos afigura mais consentânea com a psicologia dos factos.”

(do livro Leal da Câmara)

Expulsos da cidade de Lisboa, despojados de todos os bens e sem ofício definido, aos mouros não lhe restou outra saída senão cavar as terras à volta de Lisboa, para assim poderem sobreviver. Desse trabalho forçado também nos ficaram os vocábulos “moirejar” e “trabalhar como um moiro”. É assim explicada a origem dos saloios.

Segundavida

sábado, 8 de março de 2008

Às mulheres

“A mulher foi feita da costela do homem, não dos pés para ser pisada, nem da cabeça para ser superior, mas sim do lado para ser igual, debaixo do braço para ser protegida e do lado do coração para ser amada.” Maomé

Palavras sábias do profeta, mas na maioria dos povos Islâmicos e um pouco por todo o mundo, as mulheres continuam a ser discriminadas, agredidas, maltratadas e violentadas.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) proíbe toda a forma de discriminação com base no sexo, garante o direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal, reconhece a igualdade perante a lei e igual protecção contra toda a discriminação que infrinja a Declaração.

Lamentavelmente a DUDH continua a não ser cumprida em muitas sociedades. A violência contra as mulheres é um problema de todos, cabe-nos lutar contra este flagelo, ajudando, protestando e testemunhando. As vítimas, entendendo-se o medo das represálias, não se devem resignar calando o sofrimento, pois isso só contribui para a impunidade dos agressores. Também as autoridades deverão desenvolver todas as diligências necessárias para que os agressores sejam levados à justiça e os Tribunais se encarreguem de a aplicar com prontidão.

Este dia não é para ser celebrado, pois o dia da mulher é todos os dias, mas para ser meditado e relembrado que existem muitas mulheres a sofrer. A todas elas a minha solidariedade, desejando que a paz, harmonia e felicidade retorne aos seus corações.

Segundavida

quarta-feira, 5 de março de 2008

Este país não é para velhos


Na última semana estreou nas nossas salas de cinema o filme, o título intrigava-me e eu então fui ver. Arrecadara quatro estatuetas douradas, só por isso recomendava-se. Nos anos oitenta, uma sangrenta luta pela posse de um malote cheiinho de dinheiro deixada num fracassado negócio de droga e “aproveitada” por um caçador de prémios. Crime, acção e sangue a rodos, o desempenho do Javier Bardem é fantástico, que encarna um psicótico e perigoso assassino o qual jogava a vida das suas vítimas num simples gesto de moeda ao ar, pois não podia deixar o malote em mãos alheias.

A sua interpretação valeu-lhe o prémio para o melhor actor secundário, que foi bem entregue, já sobre a melhor realização, os irmãos Coen também mereceram a distinção, agora quanto ao melhor filme, na minha opinião, não foi bem atribuído, pois o derramar gratuito de tanto sangue não pode ser notabilizado.

Neste filme também temos um Xerife, interpretado por Tommy Lee Jones, que se decide mais por apoiar psicologicamente os fracos, que na realidade nenhuma culpa têm, do que apanhar o infalível e terrível assassino. Os tempos apresentavam-se-lhe de mudança, descambavam para uma criminalidade cada vez mais cruel, a idade começava já a pesar e descobriu que “Este país não é para velhos”, não tinha mais argumentos para tal cenário.

Curiosamente foi também nesta semana que o nosso país foi grassado por uma série de crimes violentos. Dizem que andamos atrasados em relação às grandes potências, neste panorama apetecia dizer “ainda bem”, precisamos de progresso mas no que toca à criminalidade violenta, bem pode por lá ficar. Parece que os vinte e tais anos estão ultrapassados, esperemos que neste país os novos enveredem por bons caminhos e os velhos nunca percam a vontade de lutar. Para isso cabe um papel importantíssimo aos nossos governantes, pois para se trabalhar no combate ao crime, que é uma missão bastante espinhosa, são necessários meios, motivação e reconhecimento.

Segundavida

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Vale sempre a pena

QUE MÚSICA ESCUTAS TÃO ATENTAMENTE

Que música escutas tão atentamente
que não dás por mim?
Que bosque, ou rio, ou mar?
Ou é dentro de ti
que tudo canta ainda?
Queria falar contigo,
dizer-te apenas que estou aqui,
mas tenho medo,
medo que toda a música cesse
e tu não possas mais olhar as rosas.
Medo de quebrar o fio
com que teces os dias sem memória.
Com que palavras
ou beijos ou lágrimas
se acordam os mortos sem os ferir,
sem os trazer a esta espuma negra
onde corpos e corpos se repetem,
parcimoniosamente, no meio de sombras?
Deixa-te estar assim,
ó cheia de doçura,
sentada, olhando as rosas,
e tão alheia
que nem dás por mim.


Eugénio de Andrade
(Coração do dia)




Vale sempre a pena esperar

Vale sempre a pena ter esperança

Vale sempre a pena tentar

Porque poderá vir o dia

Que o amor sopre a mesma melodia.

Segundavida

sábado, 9 de fevereiro de 2008

Arquivados



Ultimamente temos visto um contínuo arquivar de processos judiciais, outros arrastam-se penosamente durante anos e anos, os números falam por si e o resultado será certamente também o arquivamento. Não vou apontar quais, pois são do conhecimento público e estão à vista. Certo é que, corruptos, violadores, pedófilos e outros criminosos das mais variadas estirpes, continuam a fugir às malhas da justiça.

Pergunto, o que é que está a falhar?

O governo avançou para uma reforma da justiça no sentido de esta ser mais célere e eficaz, para mim não foi mais que experimentações em várias situações, em que o resultado é “tapa a cabeça e descobre os pés”. As dificuldades para a investigação aumentaram e levam ao cometimento de erros, que, por sua vez, para justificação desses erros, levam a declarações públicas infelizes. Certo é que temos um sistema judicial encalhado, que deixa escapar os “espertos”, punindo apenas a arraia-miúda.

Assim a democracia em Portugal continua enferma!

Segundavida

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

Carnaval Português

A origem do Carnaval é obscura, conta-se que nos primórdios da humanidade, na Primavera, as pessoas utilizavam máscaras, pintavam o rosto e o corpo para espantar os maus espíritos das colheitas. Do mesmo modo, também em celebrações e agradecimentos à mãe natureza faziam festivais anuais.

Posteriormente fala-se em festejos Egípcios de homenagem à deusa Isis, de eventos a deuses Gregos, festejos Lupercais (em honra ao deus Pã, protector dos rebanhos), de festivais em Roma dos Césares, ligadas às famosas Saturnálias (festas dedicadas ao deus Saturno), de carácter orgíaco e também de fenómenos astronómicos e naturais como o regresso do sol na Primavera.

Quanto à palavra Carnaval, a mais “sonante” pensa-se que deriva da palavra Carnelevarium que significava a véspera da quarta-feira de cinzas e quando começava a abstinência da carne para os católicos. Desde a idade média, o Carnaval está associado ao calendário cristão e representava, naquela época, o período de festas profanas que se iniciava ou a partir de 25 de Dezembro, ou no Dia de Reis, e se estendia até a Quarta-Feira de Cinzas, quando começavam os jejuns da Quaresma. (pesquisado na net).

máscaras de Veneza (da net)

O Carnaval festeja-se um pouco por todo o mundo católico sendo de realçar o de Itália (Veneza), Alemanha (Munique), de França (Paris), mas o mais importante e espectacular está considerado o do Rio de Janeiro, no Brasil.

Em Portugal, o Carnaval até à década de 80 era festejado da forma tradicional portuguesa, mas o tema poderia ser diferente de terra para terra. Na generalidade assistiam-se a brincadeiras com máscaras artesanais e disputas para ver qual seria o melhor mascarado; faziam partidas dizendo mentiras de modo a enganarem o familiar, vizinho ou amigo; também era muito usual os homens vestirem-se de forma ridícula ou de mulher e vice-versa; outros, molhavam quem passava na rua com bisnagas ou pistolas de plástico e também metiam papelinhos na boca do amigo ou familiar, muitos ficavam chateados, por isso costumava-se dizer “é Carnaval ninguém leva a mal”.


Na minha juventude foi assim de tudo um pouco, o último que me lembre e que “brinquei a sério” foi quando eu tinha cerca de 18 anos, disfarcei-me de múmia, foi um dia inteiro a cortar lençóis velhos, com a ajuda da minha irmã enrolei-me completamente de tiras brancas. Poderei dizer que foi um sucesso pois lá na terra ninguém conseguiu adivinhar quem era tal figura. Hoje, para mim, o Carnaval pouca importância tem, pois outros valores se levantam.

Em algumas zonas do país nunca se perderam as origens mais remotas, como os Caretos de Podence (clicar) do Nordeste Transmontano e os de Lazarim (clicar) na zona do Douro. Também os de Torres Vedras, Ovar e Sesimbra, continuam a ser fiéis às suas raízes e porventura outros espalhados pelo país.

É de enaltecer a persistência das gentes destas regiões em não deixar perder a originalidade destes festejos, vale mais assim do que andar a fazer plágios por vezes grosseiros e caricatos de Carnavais doutros países.

segundavida