quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Contra-natura

Numa entrevista a um tal indivíduo que se auto-intitula Conde White Castel, para uma revista do panorama nacional, numa fase da conversa sobre a relação que “ele” mantinha com o filho, a jornalista perguntou-lhe, “ Têm conversas sobre sexo?”, tendo ele respondido “…digo-lhe que pode ter as namoradas que quiser, mas para nunca as engravidar, se não deserdo-o na totalidade”. Seguidamente interrogou-o, “Não gostava de ser avô?”, ao que ele respondeu, “Odiava…tio para sempre! Adoro crianças, mas entrava em pânico se tivesse uma coisinha mínima a chamar-me avô. Fazia uma plástica, esticava-me todo.”

Da individualidade que se trata tudo se pode esperar, pois já tantos comportamentos ridículos teve e barbaridades disse, mas estas palavras deixaram-me arrepiado de tanto asco, são uma aberração, como quem as proferiu. Ser avô/avó é o testemunho da continuidade, a oportunidade de dar colo, afagar uma vida inocente e ternurenta. É o símbolo da esperança.


A natureza humana é como uma árvore que nasce, cresce, se ramifica, floresce e deita as suas sementes à terra, as quais, por sua vez, vão dar lugar a novos rebentos que continuarão o ciclo da vida. Como é possível que um pai ameace e intimide o seu filho para que não dê continuidade à vida? Só um ser egoísta, perverso e contra-natura!

Segundavida

sábado, 9 de agosto de 2008

Vendilhões de dignidade

Nestes últimos tempos estive um pouco ausente da net, principalmente da blogosfera, não sei explicar a razão, algumas vezes por falta de tempo devido ao trabalho, outras, por falta de inspiração, ou, por ter o pc ocupado pela minha herdeira, que está em férias escolares, mas aqui estou eu a escrever sobre um tema que tenha andado a matutar.


Quando era pequeno ouvia dizer a meus pais que o dinheiro era a coisa mais porca que existia à face da terra, explicando que as notas e moedas passavam de mãos para mãos de todo o tipo e classe de gente, desde o mais pobre ao mais rico, do arrumador de automóveis ao engenheiro ou do doente ao são.

Eles simplesmente se referiam à matéria de sujidade que o dinheiro vai adquirindo e suportando ao longo dos tempos, mas nos dias de hoje eu poderia responder-lhes que o dinheiro também transporta consigo e cada vez mais, outro tipo de sujidade, uma espécie de imundice indecorosa e por vezes desonesta, que conspurca a alma de muita gente.

Vários acontecimentos na nossa sociedade levam-me a reflectir que o muito dinheiro, fama e poder “transformam o visual” de certas pessoas. Com a riqueza, por magia, os velhos passam a novos e os feios ficam lindos de morrer. Quantas vezes têm assistido na nossa sociedade, a enlaces de velhos e feios com novas e lindas mulheres e vice-versa!? Claro que toda a gente tem direito à felicidade, mas nestes casos é só hipocrisia e (im)puro jogo de interesses. Poderia focar alguns casos mas não vale a pena, pois são do conhecimento de muita gente.

Na maioria dos casos de corrupção, tráfico de droga e burlas, o dinheiro é o móbil e leva muita gente a vender a sua alma.


Também no mundo do futebol, o dinheiro faz perder a lucidez. Ultimamente, no nosso panorama futebolístico, surgiram dois ou três casos, destacando um jogador de uma das três equipas “grandes”, tido como um exemplo de futebolista, com grande carácter, uma humildade e dedicação ao clube de assinalar, que vendo a oportunidade de ganhar milhões, ficou ofuscado, esquecendo os compromissos assumidos.

Pelos vistos, não há nada que o dinheiro não compre, até a dignidade!

Segundavida

terça-feira, 17 de junho de 2008

Voltámos aos três efes

Fátima, Fado e Futebol, ouvia dizer que nos tempos do antigo regime, marcados pela miséria e opressão da ditadura do Dr. Oliveira, eram estes três eventos, com as iniciais em efe, que abafavam as mágoas da grande maioria dos Portugueses.

Nos tempos que atravessamos, também a maioria está a atravessar uma difícil crise, desta vez causada na minha opinião por factores externos, entre eles a guerra do petróleo, cada vez mais escasso e de que somos totalmente dependentes.

O nosso governo, cativo das rigorosas exigências da UE, viu-se obrigado a apertar-nos o cinto, protelando a subida de escalões dos funcionários públicos, bem presos pela rédea e aumentado os impostos, que por sua vez atingem todos os sectores económicos do país. E quem paga a maior fatia da crise são as classes mais desfavorecidas, pois as perdas para “os outros” são apenas migalhas.

Crise, mágoas, preocupações e lá voltamos aos três efes. Em Fátima eram milhares e milhares, nunca se viram tantos peregrinos, este ano bateram-se os recordes de afluência ao santuário. Outros, em suas casas acompanharam religiosamente as cerimónias transmitidas pelos meios de comunicação social. É grande a fé em Nossa Senhora para que a graça divina atenue as dificuldades da vida e nos proteja das desgraças.

Ao fado, já se lhe conheceram melhores dias, ele já não é um fado que canta um “povo que lava no rio” mas seja como for, permanece enraizado na nossa cultura, pois ele procura cantar o destino e a vida das gentes do nosso povo, que continua a “talhar com o seu machado as tábuas do (...) caixão”.

Quanto ao futebol, foi, é e pelos visto será sempre um fenómeno nacional. A semana é vivida, para muitos, em função do que acontece no futebol, principalmente no que se refere ao Porto, Sporting e Benfica: fazem-se prognósticos para o fim de semana, depois discutem-se os resultados dos jogos e no início da semana faz-se o rescaldo, tudo isto com grande paixão e mediatismo dos meios de comunicação social e umas borracheiras à mistura.

Em pleno Euro 2008, a nossa selecção passou aos quartos de final da competição, é a euforia total, agora todos nós esperamos que Portugal chegue à final de Viena e vença o Euro.

É assim, qual crise? Vamos esquecer os impostos, os baixos ordenados, o aumento constante da gasolina, as dificuldades da vida, vamos rezar, ouvir cantar o fado e ver futebol, pois há que ter fé num futuro melhor.

Segundavida

segunda-feira, 2 de junho de 2008

A caminho...do fim!

A caminho


A matéria encaminha-se para o caos como um rio se dirige para o mar.
Nós, os vivos, somos como pirogas lutando contra a corrente do tempo. Tentando iludir o tempo. Mas ele conhece apenas um caminho, segue sempre pela mesma vertente, aquela que conduz à decadência.

Preservamos a nossa forma destruindo outros seres vivos. A nossa existência resulta sempre duma pilhagem. É que a vida é canibal. A vida devora a vida.

Tudo aquilo que começa tem de acabar, senão de que serviria o tempo? E ao tempo nunca ninguém contrariou. Onde é que se viu um rio subir rumo à fonte ou um pintainho voltar para o seu ovo? O fogo mais devorador acaba sempre por perder o apetite e extinguir-se. A montanha mais alta acaba por se ajoelhar transformando-se numa planície. Mas a vida, essa aí, persiste em contrariar o tempo, surge, desenvolve-se e floresce num mundo onde tudo corre rumo à maior desordem; ela foge à calma e à tranquilidade dos objectos inanimados e avança como um equilibrista que caminha sobre a corda bamba, adiando eternamente o inevitável ajuste de contas.

Fim

Mas não podemos escapar indefinidamente às estocadas do tempo. É proibido. Um dia o meu corpo abandonará a luta e restituirá ao mundo a matéria que me compõe. Esta galáxia de milhares de milhões de átomos, que outrora me formaram, morrerá como morreram as estrelas, semeando a sua matéria pelo espaço. Todos os átomos que vieram dançar em mim irão dançar noutro sítio. Um, dois, três…e lá vão eles. Migrarão para uma árvore, para o farrapo de uma nuvem, para o pelo de uma pulga… E eu deixarei cá a minha canção para que outros a cantem à sua maneira.

(extraído do filme Génesis)

Neste filme o "Mestre" demonstrou que, nesta vida, todos temos um papel a desempenhar mas que também face às leis da natureza somos tão insignificantes, que por vezes basta um sopro, para que desapareçamos da face da terra.
Tudo tem um principio e um fim.

Segundavida

domingo, 4 de maio de 2008

O início

"Foi o amor que me subtraiu ao nada. Além disso tive duas vidas, a primeira, vivida no ventre da minha mãe; a segunda, em que habitei este vasto mundo. Do momento da minha concepção ao meu nascimento, vivi em forma condensada à história da génese.

No início fui uma criatura aquática. A bolsa das águas substituiu o mar primordial do começo do mundo. Naquela altura era eu do tamanho de um feijão, era muitíssimo parecido com os animais. Naquela idade em que o nosso corpo se forma e consolida lentamente, somos todos parecidos como se fossemos gémeos, pois somos como fios de água que jorram da mesma fonte, como as nervuras de uma mesma folha, os ramos de uma mesma árvore. Somos membros da mesma tribo, a grande tribo dos seres vivos.

Foi assim que fui um bocadinho peixe, um bocadinho rã quando ainda vivia na barriga da minha mãe. Tinha guelras no pescoço e barbatanas nos flancos e flutuava entre duas águas no meu aquário flexível e redondo.

Todos os seres se constroem, célula após célula, como uma grande vila com ruas e bairros, ao som ritmado do bater do coração. E as veias traçam-nos no corpo percursos semelhantes aos dos rios na terra."

Texto que extraí de “Génesis”, um filme que achei fantástico, em que um ancião Africano, mestre da sabedoria, conta a “sua” versão da criação do mundo e da origem da vida, fazendo também uma apologia entre o ser humano e os restantes animais, acompanhado por imagens fantásticas.

Ver sinopse do filme Génesis


A todas as mães um feliz dia!

Segundavida

sábado, 19 de abril de 2008

Mudanças no divórcio

Recentemente foi aprovada na Assembleia da República uma nova lei que acaba com o divórcio litigioso.

Anteriormente o divórcio poderia realizar-se de comum acordo, ou quando assim não fosse, entrava-se num longo processo litigioso. Com as novas regras o conceito de culpa como fundamento do divórcio acaba e ele pode realizar-se mesmo sem que seja necessário o consentimento dos dois cônjuges. Neste caso a vontade de um dos membros do casal, assente em causas objectivas, pode provocar a ruptura da vida conjugal.

Outra das mudanças é que poderá incorrer no crime de desobediência aquele que não assumir as suas responsabilidades de pai ou mãe. A meu ver, com a crise que por aí vai, que resulta num sucessivo empobrecimento das famílias, não vão faltar processos em tribunal. Recentemente quiseram descongestionar os tribunais de tantos processos, com este novo cenário as secretárias vão ficar a abarrotar, pois os incumprimentos serão aos milhares.

As partilhas passarão a fazer-se como se os cônjuges tivessem estado casados em comunhão de adquiridos, mesmo que o regime convencionado tivesse sido a comunhão geral de bens. Poderão acabam-se assim os casamentos por conveniência. Também o cônjuge que tiver uma situação mais frágil e contribuído mais para a família, no momento da partilha poderá ser compensado.

O divórcio sem o consentimento de um dos cônjuges (antigo litigioso) poderá acontecer quando existir separação de facto por um ano consecutivo; alteração das faculdades mentais do outro cônjuge há mais de um ano; ausência há mais de um ano sem dar notícia, ou quando ocorram quaisquer outros factos que, independentemente da culpa dos cônjuges, mostrem ruptura definitiva do casamento (onde se inclui a violência doméstica).

Seja com as leis antigas ou com novas regras, os processos de divórcio geram sempre grandes contrariedades e sofrimento para toda a família, principalmente quando eram resolvidos de forma litigiosa e se arrastavam por longos anos. Com a ruptura do casal e quando se envolviam filhos, eram estes que pagavam a maior factura. As crianças ficavam com traumas, pouca auto-estima e eram desde logo na infância infelizes, pois julgavam que o pai/mãe as abandonavam ou não queriam saber delas.

Sou a favor da união do casal, que se deve saber perdoar e resolver os erros no seio da família, mas quando tiver que haver ruptura, se os processos se resolverem agora de forma mais célere e se forem ambos os pais a acompanharem as situações de particular importância para os filhos, esperemos ao menos que, principalmente as crianças, tenham o seu sofrimento minorado.

Segundavida

domingo, 6 de abril de 2008

Os saloios

“À roda das grandes cidades vive uma população que, morfologicamente, pelo menos, parece distinta da urbana, a quem alimenta até certo ponto e a quem serve com assistência regular em necessidades, por via de regra, fundamentais. Em Paris são os maraicheres; em Roma, noutros tempos, os sabinos; em Lisboa os saloios” (do livro Leal da Câmara)

Desde que se me surgiu a faculdade de entender as “coisas”, ouvia chamar saloio àquele que era tosco, sem formação e até simplório. Outros chamavam de uma forma pejorativa “esperteza saloia”

Quando cheguei à região de Lisboa, migrado da Beira Baixa, comecei a ouvir que na zona noroeste de Lisboa existia a zona saloia. Principalmente habitantes dos conselhos de Mafra, Loures e Sintra, os “saloios” eram agricultores e artesãos nascidos e criados nessas regiões, os quais vinham comercializar os seus produtos para a cidade de Lisboa. Em tempos eles trajavam de um modo original, com roupas folclóricas e botas. Os homens usavam barretes na cabeça e a barba era do tipo suíças, que deixavam apenas o queixo a descoberto. As mulheres vestiam compridas saias coloridas, botas ou tamancas e mantéus na cabeça.

rancho folclórico representando a gente saloia

Interrogava-me muitas vezes donde provinha a palavra saloio, pelo que a curiosidade me levou a consultar nas bibliotecas os livros antigos da zona. Um deles, com o título “Leal da Câmara”, um estudioso das gentes saloias, deu-me as respostas que ambicionava.

As origens

“Quando D. Afonso Henriques, com ajuda dos Cruzados, tomou a cidade, estava ela repleta de mouros, repleta como um ovo. Explica-se: não teria sido outro o lugar de confluência dos fugitivos. Osberne refere que foram contados em Lisboa nada menos de 154.000 homens, afora mulheres e crianças, o que devia pelo menos duplicar este número. Tendo em vista que a urbe se limitava ao morro do Castelo, cingida em seu âmbito pelos arrais dos opugnadores, levantados no monte de S. Francisco, a Ocidente, no monte de Santa Ana, a Norte, no monte de S. Vicente de Fora, a leste, compreendidos ainda os vales circundantes, pasma-se como podia caber tanto povo num espaço tão reduzidíssimo.

Quando os cristãos, à frente as hostes de Gulherme de Longa Espada, entraram na cidade, não tardou que começasse a carnificina e o saque. Os cruzados não tinham vindo para outra coisa, e não houve compromisso nem palavra jurada que os impedisse de satisfazer a avidez e instintos ferozes. Fartaram-se de matar nos perros infiéis os bravos combatentes, mas ainda ficou muita gente. (…..) A tanta brutalidade, como podiam responder os vencidos que não fosse amontoados nas praças, vielas (….) erguendo mãos súplices e implorando Alah?!

Assim os escravos mouriscos faziam a salah, que na gíria do fero vencedor deu lugar a saloio, o homem das rezas e das mesuras, batido vendido e tocado à chibata, ridículo e ao mesmo tempo miserando. Tal é a explicação que se côa da etimologia fornecida por Pinho Leal e que se nos afigura mais consentânea com a psicologia dos factos.”

(do livro Leal da Câmara)

Expulsos da cidade de Lisboa, despojados de todos os bens e sem ofício definido, aos mouros não lhe restou outra saída senão cavar as terras à volta de Lisboa, para assim poderem sobreviver. Desse trabalho forçado também nos ficaram os vocábulos “moirejar” e “trabalhar como um moiro”. É assim explicada a origem dos saloios.

Segundavida